Estive literalmente coçando a cabeça na última semana em busca de uma frase para descrever melhor o detetive Cole Phelps, o quase infalível protagonista do game “L.A. Noire”, que chegou às lojas dos EUA nesta semana e deve desembarcar por aqui no início de junho. Cogitei “puritano”, o que pareceu reduzi-lo, e considerei vagamente “atormentado”, mas pareceu desnecessariamente trágico. O termo que continuava voltando era “motivado” – motivado por sua moral inabalável, por sua inteligência e pelos demônios que apareceram quando lutou na 2ª Guerra Mundial.
É essa impulsão que ao mesmo relaciona e separa Phelps dos protagonistas de outros games da Rockstar. O fundador da desenvolvedora Team Bondi e roteirista e diretor de “Noire”, Brendan McNamara, descreve o detetive à primeira vista como um “garoto dourado” e um herói de guerra que persegue criminosos, mais parecido com o determinado detetive Edmund Exley do livro/filme “Los Angeles – Cidade Proibida” do que com o caubói John Marston, do game “Red Dead Redemption”, da própria Rockstar. Preferindo seu bloco de notas e caneta no lugar de sua Colt .45, as armas mais perigosas de Phelps são sua ambição e esperteza. Mas assim como seus antecessores Marston e Niko Bellic, de “GTA”, o investigador é um produto de seu passado manchado de sangue. E ao longo dos 21 casos de “L.A. Noire”, ele terá de confrontá-lo e, esperançosamente, superá-lo.
Anunciado como um “thriller de detetives” com uma atmosfera de época, o novo jogo é bem diferente dos famosos títulos de mundo aberto da Rockstar, como os já citados “Grand Theft Auto” e “Red Dead Redemption”. Claro que ele traz os mesmos elementos cinematográficos sempre presentes nos impressionantes trabalhos do estúdio, como correr e atirar e uma grande quantidade de emocionantes perseguições de carros. Mas “Noire” está mais para “Tex Murphy” do que “GTA”, colocando a intuição dos jogadores à frente da velocidade com que apertam os botões.
Novo game da Rockstar coloca jogadores na pele do detetive Cole Phelps
Os dois principais elementos de jogabilidade – investigação da cena do crime e interrogatório de testemunhas e suspeitos – são situações tensas que exigem toda a atenção possível dos gamers. As investigações pedem um olho afiado para pistas vitais, assim como muita paciência, já que cada cena possui elementos que podem desviar sua atenção. Cheias de detalhes indicativos e momentos do tipo “aha!”, essas sequências de investigações conseguem ser interessantes sem cair no tédio, e apresentam uma abordagem elaborada (e uma evolução) em relação aos games de aventura.
Os interrogatórios são ainda mais exigentes, colocando os jogadores cara-a-cara com civis e criminosos que normalmente mentem, enganam e sonegam informações importantes. Essas sequências trazem uma abordagem mais madura para as investigações. Mas quando os jogadores não estão apresentando evidências pesadas para acabar com alegações mentirosas, eles terão de usar seus instintos para determinar se os supostos suspeitos estão realmente dizendo a verdade. É algo mais desafiador do que parece – em razão também pelo grande papel desempenhado pela sempre impressionante tecnologia de reconhecimento facial MotionScan – e o roteiro realista realmente ganha vida com algumas das “atuações” mais convincentes que já vi em um game.
Apesar de as armas ficarem um pouco em segundo plano, os momentos mais cerebrais do jogo regularmente dão lugar para cenas cheias de ação. A natureza roteirizada de “Noire” apresenta oportunidades para algumas cenas incrivelmente cinematográficas, incluindo uma impecável perseguição a pé por um antigo estúdio de filmagem, e um memorável tiroteio que acontece em uma fábrica de gelo. O protagonista Phelps não é tanto um “homem de uma arma só” como Bellic, de “GTA”, ou Marston, de “Red Dead”, mas a jogabilidade com armas da Rockstar continua sendo muito gratificante.
Em "L.A. Noire", gamers precisam perseguir criminosos na perigosa Los Angeles da década de 1940
Baseado no número de pistas encontradas, questões respondidas corretamente no interrogatório e danos/ferimentos colaterais, o game te dá uma classificação em estrelas ao final de cada caso. Isso, combinado com as diferentes opções de diálogos e personagens coadjuvantes, conta muito para o game ser jogado mais e mais vezes e fez com que eu ficasse recomeçando casos recém-terminados com a esperança de resolvê-los de maneira melhor e mais eficiente.
Quase todos os casos são firmemente costurados e geralmente trazem histórias completas e independentes, apresentando, assim, situações terríveis para Phelps e seu parceiro resolverem. Apesar de o amável detetive Phelps fazer um bom trabalho em conduzir sozinho as investigações, é a sua harmonia com os vários parceiros que adiciona uma camada extra aos procedimentos. O cordial Stefan Bekowsky ajuda nos casos de tráfico e negócios ilegais, enquanto o agressivo Rusty Galloway dá uma força para resolver homicídios. Além disso, merecem destaque o bajulador Roy Earle e o exausto Herschel Biggs. Cada um deles se contrapõe a Phelps de sua própria maneira, mas todos oferecem muito mais do que apenas provocações descartáveis – eles ajudam a moldar a trama do jogo e até mesmo fornecem pistas para a investigação e direções para Phelps quando necessário. Por isso, são adições valiosas e algumas vezes amáveis para a história do protagonista, além de também atuarem como aparelhos narrativos ingênuos.
Boa parte do jogo trata de investigar cenas de crimes e interrogar suspeitos/testemunhas
A história em si é contada em três linhas diferentes: a que traz Phelps na cidade de Los Angeles em 1947 à medida que ele tenta subir de posição no departamento de polícia da cidade; uma narrativa convergente contada por meio de cutscenes baseadas em jornais que seguem um jovem impetuoso que já foi dos Marines e estuda medicina; e uma série de flashbacks que contam a tortuosa turnê do protagonista pela 2ª Guerra. É uma trama interessante que traz à mente o famoso autor de livros policiais James Ellroy (que vem à FLIP deste ano), assim como o ícone da literatura pulp Raymond Chandler. E apesar de a natureza episódica do game algumas vezes obscurecer o quadro mais geral da história, especialmente nessa terceira parte, de forma geral é uma narrativa forte e satisfatória que pinta um vívido retrato de uma Los Angeles dominada pelo crime em uma de suas épocas mais violentas.
Por mais interessante que seja a história, a verdadeira estrela do game é a Los Angeles pós-guerra que Phelps deve proteger. É um dos ambientes de videogame mais ricos e impressionantemente renderizados que vi nos últimos tempos, e não importa o que o detetive esteja fazendo, a famosa Cidade dos Anjos brilha como um cenário memorável e brilhante. A cópia que joguei para este review, antes do lançamento da versão final, travou algumas vezes e apresentou pequenas falhas nos gráficos, mas nada que atrapalhasse a jogabilidade.
Apesar de “L.A. Noire” talvez não agradar a todos gamers pela sua temática, aqueles fascinados por seus caminhos perigosos provavelmente amarão cada segundo do game.
É um passo corajoso e cinematográfico à frente em um gênero que estava suplicando por inovação. Além disso, a implementação da tecnologia MotionScan realmente representa uma mudança de jogo. Demorei cerca de 20 horas terminar a campanha principal (sendo que algumas foram admitidamente usadas para jogar novamente casos já encerrados e perseguir criminosos nas ruas), mas já estou ansioso para reabrir os arquivos de casos de Phelps na próxima oportunidade disponível. Acima de tudo, “L.A. Noire” é algo novo e algo que acredito que essa geração precisa muito. E isso é simplesmente fantástico.
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